A última década tem sido de uma agressividade inacreditável na política americana. Primeiro nos anos Bush, agora com Obama, o discurso das oposições tem sido de uma violência exagerada em alguns sectores radicais. Basta olhar para os cartazes das manifestações da última década, primeiro contra Bush e recentemente contra Obama, para verificar isto. Outra das características da política americana, esta bem mais antiga, é a utilização de linguagem de guerra. "War Room" era como o circulo restrito de Bill Clinton se identificava. "Targeting" é uma denominação que muitos consultores utilizam há décadas. Obama ainda recentemente utilizou este tipo de linguagem "If they bring a knife to the fight, we bring a a gun". Que isso leva a actos criminosos como o de Tucson? Não. Se na parte sobre a violência verbal, parece-me aconselhável e até desejável que se modere a linguagem, não vejo problemas na utilização de metafóras de guerra, que fazem parte da retórica política. Já agora, de onde virá a palavra "campanha"?
Um dos aspectos que mais me impressionou nesta tragédia, obviamente além da mortandade e do atentado contra a democracia americana, foi a reacção de alguns sectores mais à esquerda. Estava no Twitter quando se soube do ataque à congressista Giffords. E logo após o crime, enquanto a maioria dos americanos que sigo pedia orações* pelas vitimas, começaram a surgir ataques raivosos contra o tea party e as vozes mais populistas do movimento. Apesar de não saberem nada sobre o assassino e se este tinha alguma relação com o tea party (como hoje é quase certo que não tem), iniciaram o jogo da culpa sobre os adversários políticos sem se questionarem um minuto a pensar no que realmente tinha sucedido. O popular blogue de esquerda, o Daily Kos, que dois dias antes tinha publicado um post com um título do género, (For me Congresswoman Gabrielle Giffords is DEAD), por esta ter votado contra Nancy Pelosi como Speaker este mês, liderou a ofensiva contra a violência verbal do tea party e Sarah Palin. Chegou-se mesmo a dizer que Palin tinha as mãos manchadas de sangue, uma expressão injusta e desadequada ao momento. Todas as informações já conhecidas apontam para que Jared Lee tenha actuado sobretudo devido às suas condições mentais instáveis. Um ateu, registado como eleitor independente que nem sequer votou em 2010, fã de Karl Marx e Adolf Hitler e que glorifica a queima da bandeira americana, não se enquadra em nenhum perfil político definido, muito menos na direita conservadora do tea party.
Que esta tragédia sirva para ataques políticos é lamentável. Que se discuta o nível de civilidade no debate político, essa é outra questão e que deve e pode ser discutida. Como não gostava de ver nas ruas americanas a comparação entre Bush e Hitler ou a pedirem o assassinato do Presidente, também não gosto de ver agora Obama a ser comparado com Hitler ou a agenda democrata a ser considerada equivalente ao nazismo ou ao comunismo. Simplesmente não este tipo de argumentação não tem lógica. E os líderes de ambos os partidos têm o dever de desligarem-se deste tipo de provocações. O que nem sempre tem sucedido.
* Deu para ver que os americanos são de facto uma nação de fé. Desde a esquerda à direita, quase todos os americanos que sigo (jornalistas, políticos, consultores de comunicação, académicos e bloggers) diziam que era necessário "rezar" pelas vítimas.