No último fim de semana Pedro Passos Coelho reuniu-se com blogues durante o congresso do PSD. Uma iniciativa que já tinha sido ensaiada por alguns responsáveis políticos, como José Sócrates, Paulo Rangel ou Francisco Louçã. Esta reunião suscitou reacções por parte de alguns jornalistas que não gostaram de ficar de fora. O Rodrigo Moita de Deus escreveu sobre isso e explicou em poucas palavras o que é e o que representa a blogosfera portuguesa. A Alda Telles escreveu um post sobre o assunto e referiu o exemplo dos Estados Unidos, onde 52% dos blogues se assumem como jornalistas. Não conhecendo o estudo em causa, não me causa estranheza estes números. Mas interessa-me discutir o papel blogosfera norte-americana no campo da política. É um campo carregado de significado político e ideológico.
A blogosfera nasceu nos Estados Unidos e foi lá que ela se desenvolveu de forma mais positiva e com maior capacidade para influenciar o rumo dos acontecimentos. A primeira campanha a nascer e desenvolver-se na blogosfera foi precisamente a de Howard Dean em 2003/4, quando emergiu como frontrunner da nomeação democrata. A rede de blogues que floresceu no verão de 2003, ancorado no blogue Dean For America, tornou possível a um desconhecido candidato nacional despontar como possível vencedor. A sua campanha viria a desabar no caucus do Iowa, mas ficaram as raízes para o sucesso dos blogues na politica americana. À esquerda e à direita vários blogues foram ganhando relevância mediática, transformando-se depois em verdadeiras âncoras digitais para projectos ideológicos na Internet. O mais conhecido é o “liberal” Huffington Post, que é hoje uma instituição muito relevante na politica americana. Arianna Huffington é mesmo uma das personalidades consideradas mais influentes na sociedade americana. Também à esquerda, o Daily Kos, do fundador Markos Moulitsas, que emergiu na campanha de Dean, evoluiu para o mainstream, sendo hoje um farol da esquerda americana na Internet. À direita, o Townhall também ganhou uma enorme relevância, tendo até iniciado em 2008 a publicação de uma revista. Estes espaços também fazem jornalismo, pois dão notícias. Mas são uma visão ideológica da realidade. Um pouco também como os media tradicionais americanos, pois a isenção está num estado de falência no jornalismo americano. E não é apenas a Fox News, como por cá às vezes se quer transparecer. Exemplos do outro lado temos o New York Times, a MSNBC ou mesmo a CNN (esta mais disfarçada) e os espaços noticiosos da CBS ou da NBC.
Ao lado destas “instituições” da Internet, estão os blogues de activistas republicanos e democratas, que têm um papel muito relevante na discussão pública. Tal como em Portugal, muitos destes bloggers ganharam espaço próprio nos media tradicionais. Mas ao contrário do que sucede em Portugal, os blogues mais relevantes assumem abertamente o combate político-partidário, funcionando muitas vezes como extensões das estratégias dos partidos. E por vezes, conseguem mesmo liderar as estratégias dos políticos. Estão no meio do jogo partidário e interagem nele através dos blogues. Não são tratados como jornalistas, mas muitos deles têm briefings especiais com dirigentes políticos. A diferença que encontro é que não serão propriamente reuniões para informar e ouvir, mas sim para acertar estratégias para o combate político e eleitoral. A apregoada independência político-partidária que encontramos em muitos blogues políticos em Portugal é mais difícil de encontrar nos blogues mais lidos dos Estados Unidos. Certamente que há alguns casos, como o Political Wire, que estão desligados a luta política, e são meramente informativos. E estes transformaram-se em verdadeiras fontes de informação pública. Mas os blogues mais conhecidos, como o Hot Air, Think Progress ou NewsBusters estão no meio do combate político-partidário. Por fim há alguns blogues com muita audiência que estão ligados a media tradicionais, como o Daily Dish do Andrew Sullivan ou o The Corner.
Os partidos há muito que viram neles a importância que têm no combate político. Desde 2004 que os blogues tem um espaço próprio nas Convenções dos Partidos. Eu estive na Convenção Republicana de 2008, e tive a oportunidade de verificar que os blogues são tratados como mais um media, ao lados dos restantes. O espaço para os mais de 15 mil membros credenciados estavam divididos por áreas: televisões nacionais, televisões estrangeiras, rádios, agencias noticiosas, jornais nacionais, jornais locais e blogues. Nem mais nem menos. As conferências de imprensa eram abertas a todos os media, todos recebiam informação do Press Office e havia assessores destacados para auxiliar cada corpo dos media. Em paralelo, foram organizados diversos eventos para as diversas categorias - houve duas sessões organizadas num hotel especificamente para os bloggers credenciados com personalidades do Partido Republicano e uma com o CEO da Google. Num destes eventos, tive a oportunidade de assistir a um recrutamento de um blogger. Um congressista republicano dirigiu-se aos presentes e disse que pretendia contratar um blogger para trabalhar com ele nos Young Eagles (organização que representa novos congressistas). Com o espírito prático dos americanos, logo um se ofereceu e no final presumo que tenha saído do hotel contratado.
O que tenho assistido nos últimos tempos é um crescimento da influência dos blogues na política americana. São mais um campo de batalha dos partidos e dos candidatos. A independência politico-partidária é bem menor do que em Portugal, mas isso também sucede nos colunistas e comentadores dos jornais e televisão, onde quase todos se assumem como republicanos ou democratas. Tal como nos media tradicionais, os blogues americanos assumem a sua bandeira e lutam por ela. Sem pretensões de isenção.