Volto a este tema, depois de ter lido muitos erros e clichés sobre este movimento, nomeadamente no nosso país. Às vezes porque as análises se ficam pelo superficial, outras vezes porque se limitam a descarregar os estereótipos tradicionais que existem sobre a vida política norte-americana. Os Estados Unidos são normalmente divididos na Europa entre os bons (democratas e liberais) e os maus (republicanos e conservadores). O Tea Party, sendo um movimento eminentemente conservador, já foi colocado no lado mau, e por isso, será sempre encarado como extremista e radical. Várias vezes já o vi colado à extrema-direita racista. Nada de novo, pois esta caracterização até tem vindo a ser explorada pelos Democratas nos Estados Unidos, sendo que a sua visão partidária e parcial faz sempre escola na Europa. O que é dito pelos meios liberais americanos é sempre uma verdade incontestada para alguns.
Mas interessa primeiro saber quem são estas pessoas e o que defendem. A Gallup publica esta semana uma sondagem sobre o Tea Party esclarecedora sobre quem se considera parte deste movimento. Não surpreendentemente, 49 por cento são republicanos, 43 independentes e apenas 8 por cento democratas, sendo que 28 por cento dos americanos considera-se representado pelo movimento. Quase um terço da população, o que não deixa de ser significativo. Mas esta sondagem também indica que os dados demográficos não estão longe de acompanhar a realidade social americana. E o que defendem estas pessoas?
O Tea Party nasceu em oposição ao expansionismo do governo federal, nomeadamente com o plano de estímulo de Barack Obama, que se alargou à contestação da reforma da saúde. Menos impostos, menos governo e maior liberdade individual. Um movimento genuinamente americano, que surge em consonância com a tradição conservadora que faz parte do património político do país. Mas como sempre sucede em movimentos populares do mainstream americano, e este movimento já pode ser considerado como tal, surgem vozes radicais que, apesar de ultra-minoritárias, assumem um protagonismo excessivo no discurso público. E é o que tem acontecido em muitas manifestações do Tea Party, com radicais a dominarem as atenções dos media. Cartazes exagerados, gritos de ordem extremistas e alguns dos seus oradores, como vimos recentemente no discurso de Tom Tancredo na Convenção Tea Party, a transporem para a opinião pública um carácter radical e caricatural do movimento. Mas a esmagadora maioria dos seus membros são simples cidadãos americanos preocupados com o rumo do país. As tendências social-democratas da políticas da Administração Obama suscitariam sempre uma reacção categórica da sociedade americana. Ninguém esperava que o governo americano expandisse o seu papel sem que recebesse uma oposição deste género. Num país maioritariamente de centro-direita, e que faz das suas raízes individualistas uma das suas forças culturais, o Tea Party é uma correspondência objectiva dessa tradição. Muitos americanos estão preocupados com o rumo do país, e o crescimento da despesa federal, que começou nos anos Bush, e os défices exagerados que o governo terá nos próximos 10 anos, são o mote para esta contestação.
Se os republicanos conseguirem aproveitar a força deste movimento em seu favor, sem com isso desviarem-se demasiado para a direita, poderão obter excelentes ganhos em todo o território americano. Não por acaso alguns dos estados mais liberais da União, como o Delaware, Illinois ou até a Califórnia, poderão eleger senadores republicanos. Esta relação com os tea partys, se for bem gerida, poderá ser a chave do sucesso republicano de 2010.