20
Jul 17
publicado por Nuno Gouveia, às 22:24link do post | comentar | ver comentários (1)

Sempre entendi a política norte-americana com algum distanciamento, embora tenha maior proximidade histórica e ideológica com o Partido Republicano. Apesar de divergências significativas com a agenda do GOP (sobretudo nas questões sociais e culturais), sempre tive admiração pelo partido de Ronald Reagan e Abraham Lincoln. Este distanciamento não me impede de ter vários Presidentes democratas entre o meu leque de preferidos, como Harry Truman ou Lyndon Johnson (por diversos motivos que não interessam para este artigo). Daí que a eleição de Donald Trump me ter causado uma profunda consternação pelo estado do Partido Republicano e por aquilo que este se transformou. É preciso dizer que isto não começou com Trump: nos últimos anos franjas radicais da direita americana foram ganhando peso no GOP, até que um oportunista, sem ideologia bem definida, o tomasse de assalto com a cumplicidade dos radicais e omissão do sectores tradicionais.

Estes seis meses só terão surpreendido aqueles (como eu) que até  esperavam que o Presidente Trump fosse bastante diferente do candidato. Apesar de escolhas regulares para alguns cargos, como no Pentágono, na ONU ou no Departamento de Estado, os sinais estavam lá todos durante aquela longa campanha que se iniciou em Junho de 2015: a ele tudo faltava para ser Presidente dos Estados Unidos: falta de integridade, de conhecimento, de experiência política e de coerência ideológica. Sim, passados apenas seis meses, tudo isto está mais que comprovado, com consequências nefastas para os Estados Unidos, para as instituições internacionais e para a estabilidade mundial. Com excepção de uma nomeação de um juiz para o Supremo Tribunal, que sucessos podemos apontar à Administração Trump? A resposta é simples: zero. O que temos assistido é a um desenrolar de polémicas, afrontamentos, fracassos ou embaraços causados pelo incrível amadorismo de uma Casa Branca que não estava preparada para governar o país conhecido anteriormente como líder do Mundo livre.

Segundo a média de sondagens do site Real Clear Politics, Trump tem hoje uma taxa de impopularidade de 54%, a mais elevada de sempre num Presidente com apenas seis meses de mandato. Certamente haverá muitos aspetos que poderia destacar da Presidência Trump, mas apontaria para três: amadorismo; nacionalismo; isolacionismo.

A forma como a Casa Branca tem lidado com alguns dossiês tem evidenciado um amadorismo que se explica pela inexperiência política dos seus membros. Era recorrente os Presidentes preencherem lugares-chave com um misto de homens de confiança e veteranos de anteriores administrações. Foi assim com todos os anteriores Presidentes, mas não com Trump: em vez de convidar alguns elementos de anteriores administrações, como fez Obama ou W. Bush, por exemplo, Trump convidou um bando de neófitos na gestão política e quase ninguém com experiência em cargos políticos executivos. O resultado está à vista e episódios como a proibição da entrada de cidadãos de certos países islâmicos (entretanto revista), as constantes fugas de informação da Casa Branca, as tentativas de encobrimento dos contactos com a Rússia, a demissão de Michael Flynn, são apenas alguns casos. Por exemplo, neste momento, a administração Obama apenas nomeou 197 pessoas para cargos públicos que precisam de passar no Senado, sendo que apenas 46 foram aprovados. Estes números têm paralisado parte do Estado e comparam muito negativamente com as anteriores administrações. Por exemplo, Obama neste período já tinha nomeado 323 e confirmado 183. Este amadorismo que temos sentido sente-se também na fraca capacidade para liderar uma agenda transformadora no país, sendo que apesar da grande maioria que o GOP tem nas duas câmaras, ainda não conseguiram aprovar nenhum pacote legislativo significativo: a reforma fiscal e a reforma da saúde estão paradas. Mas o maior amador é o próprio Donald Trump, que tem cometido erros e gafes que embaraçariam um outro qualquer Presidente. 

A vertente nacionalista do discurso republicano contrasta também com o passado do partido: a defesa do excepcionalismo americano tem sido uma imagem de marca do GOP moderno, mas os elementos nacionalistas e radicais sempre estiveram afastados do discurso político dos seus líderes. Bastará recordar o que diziam Ronald Reagan, os Bush ou mais recentemente John McCain e Mitt Romney. À retórica republicana sempre esteve subjacente aos valores da liberdade, da democracia e da tolerância. Com Trump, a retórica (e a prática) alterou-se substancialmente: já não há uma defesa do excepcionalismo americano, mas sim do poder, da força e do nacionalismo americano. Não é por acaso que os sectores radicais e da extrema-direita americanos se aproximaram do actual GOP, com consequências imprevisíveis para o futuro, enquanto os sectores mais centristas se contorcem para não quebrar de vez com Trump, apesar das críticas que vão lançando. Ainda recentemente, os senadores Marco Rubio, John McCain e Lindsay Graham foram os mais violentos nas críticas que lançaram ao encontro entre Trump e Putin. Como observamos recentemente na viagem de Trump à Europa, os Estados Unidos têm hoje mais semelhanças com países e partidos liderados por nacionalistas, como a Polónia ou a Rússia ou as lideranças do UKIP britânico ou a Frente Nacional da Senhora Le Pen, do que com as democracias liberais e os seus antigos aliados. As palavras democracia e liberdade quase desapareceram do discurso político da atual administração, o que contrasta bastante com o passado recente. E aqui, a retórica diz muito.  

Por outro lado, esta aproximação de Trump a movimentos nacionalistas e não democráticos também nos leva ao terceiro sintoma grave dos últimos seis meses: o isolacionismo dos Estados Unidos de Trump, que já não pode ser considerado o líder do mundo livre, como acontecia desde a II guerra mundial. Num mundo em rápidas alterações, a estabilidade e segurança providenciada pelos americanos terminou com Trump. É evidente que já havia sinais dessa degradação do papel americano no mundo, mas nunca como hoje se viu os Estados Unidos tão isolados nas relações internacionais: sejam em questões com as alterações climáticas, o comércio livre ou até mesmo na NATO. Hoje já não são considerados pelos aliados como um parceiro confiável. Trump tem uma liderança que tem hostilizado os aliados tradicionais (caso do Canadá, da França, da Austrália ou da Alemanha), ao contrário de países tradicionalmente adversários, como é o caso da Rússia ou da China. A estratégia de Trump parece ser construir uma ordem mundial baseada em relações e acordos bilaterais, esquecendo as relações multilaterais que foram construídas nos últimos 70 anos. É preciso regressar aos anos 20 do século passado para encontrarmos uns Estados Unidos tão isolados do resto mundo. Nem nos anos da intervenção do Iraque assistimos ao isolamento visto recentemente na cimeira do G20. Em 2002/2003, e com divisões acentuadas sobre a intervenção do Iraque, Bush manteve ao seu lado diversos aliados, como o Reino Unido, a Espanha, os países de Leste ou a Austrália. Se Bush, talvez o anterior presidente menos consensual das últimas décadas, dividia os aliados, Trump tem conseguido unir os seus aliados: mas contra os EUA. Esta ausência de liderança internacional pode estar a ter o condão aparente de unir os responsáveis europeus, mas as brechas que se começam a sentir (como na Polónia ou na Hungria) podem a curto-médio prazo constituir uma preocupação para nós, europeus. Mas mais preocupante do que isso, até é a total ausência de pensamento estratégico nas relações entre estados em plataformas multilaterais, o que poderá redundar em acordos bilaterais entre potência (como a Rússia ou a China) que venham a prejudicar países terceiros e antigos aliados, como acontecia na era das grandes potências anteriores à Segunda Guerra Mundial. Trump pode vir a ser o catalisador do fim daquilo a que antes chamávamos mundo livre ou o Ocidente, dando lugar a uma nova ordem internacional mais perigosa, mais instável e mais insegura.


29
Abr 17
publicado por Nuno Gouveia, às 13:52link do post | comentar | ver comentários (1)

Os primeiros 100 dias de Trump não desiludiram: depois de uma campanha caótica que o levou à Casa Branca, a sua governação manteve o ritmo alucinante de controvérsias. Bem sei que quando falamos em 100 dias, estes parecem uma eternidade dado o número de situações que já ocorreram na Administração Trump. Uma demissão de um Conselheiro Nacional, investigações sobre uma perigosa relação com a inimiga Rússia de Putin, uma fracassada tentativa de derrubar a Obamacare ou a também falhada ordem executiva de impedir cidadãos de sete países islâmicos de entrarem nos Estados Unidos. Ao lado de tantos fracassos e polémicas, Trump também coleccionou algumas vitórias, como a nomeação de Neil Gorshuch para o Supremo Tribunal ou o bombardeamento da Síria, que recebeu apoios de todos os quadrantes políticos norte-americanos. Estes primeiros dias foram medíocres mas há motivos para esperar que as coisas melhorem.

O que não surpreendeu em Trump foi a sua profunda inabilidade para lidar com assuntos que desconhece, a sua ignorância sobre a diplomacia e a política internacional ou a sua falta de preparação para o cargo. Nada disto foi novidade. Tal como também não surpreendeu a agressividade que a ala nacionalista da Casa Branca, liderada por Steve Bannon, incutiu nos primeiros dias da Administração, levando a fracassos como a proibição da entrada a islâmicos de alguns países ou diversas situações de guerrilha interna que vieram cá para fora. Mas se afirmar que a Administração Trump pouco concretizou nestes primeiros 100 dias significa muito pouco (normalmente existem medidas simbólicas e pouco mais), o mais significativo deste período foi mesmo o amadorismo que Trump e a sua equipa demonstrou, colocando em evidência tudo aquilo que muitos sempre disseram.

Mas se me parece justo dizer que Trump nunca será um Presidente convencional, também podemos dizer que Trump não é nenhum ditador e nem actuará como um fascista qualquer, como muitos dos seus detratores o apelidavam. Depois de umas primeiras semanas verdadeiramente caóticas, Trump evoluiu alguma coisa e demonstrou que tem aprendido com o cargo. Governar e lidar com a realidade é bem diferente de defender soluções simplistas e simplórias. Basta recordar algumas das reviravoltas que já deu nestes primeiros três meses, pois a NATO deixou de ser obsoleta, a Rússia de ser um potencial aliado, a China de manipular a moeda, Assad de ser um elemento estabilizador, a NAFTA afinal é para renegociar e não para abandonar ou a construção do muro com o México afinal já não ser urgente. E por aí podíamos continuar. Mas Trump também também evoluiu no relacionamento com os seus colaboradores, pois tem dado liberdade aos mais experientes, como Nikki Haley na ONU, James Mattis no Pentágono ou ao general McMaster para o ajudarem a definir políticas. E tem havido sinais consistentes que a linha dura de Bannon está a perder a batalha pela governação, ao mesmo tempo que vários políticos tradicionais do Partido Republicano têm moderado a sua oposição a Trump. E, curiosamente, depois de tantas críticas ao nepotismo de ter nomeado a filha Ivanka e o genro Jared Kushner, estes têm sido dos elementos mais centristas e moderadores da linha nacionalista na Casa Branca.

Trump vai continuar a ser um presidente bombástico; certamente o seu Twitter será um elemento estranho e provocador; nunca ganhará a eloquência ou a elegância que todos queríamos ver num POTUS; e continuará a fazer muitas asneiras e a dizer coisas esquisitas. Mas se Trump for realmente "amestrado" pelo establishment, como tem dado sinais disso, talvez consiga ser um presidente Ok. Sim, porque isso é mais optimista que consigo ser neste momento.


19
Jan 17
publicado por Nuno Gouveia, às 20:06link do post | comentar | ver comentários (5)

Esta é a pergunta que tem dominado quase as conversas sobre a próxima administração americana, persistindo o pessimismo e o desânimo. E se a campanha americana tinha deixado a comunidade internacional alarmada com Donald Trump, as semanas que passaram após a sua histórica vitória de Novembro contribuíram para aumentar esse negativismo. A sua postura continua errática e imprevisível, tecendo declarações que revelam perigosos sinais, sobretudo para os aliados de sempre dos Estados Unidos, sejam eles da Europa, da Ásia ou das Américas.

 

Não acrescentarei muito se disser que as relações com os seus aliados da Nato preocupam todas as chancelarias europeias, sobretudo os países de leste que se sentem ameaçados pelo urso Russo, os vizinhos México e Canadá, que estão em estado de alerta sobretudo devido às críticas ao Nafta e a insuportável insistência que o México irá pagar o muro, ou ainda a ameaça de guerra comercial à China que não interessa a ninguém, sobretudo aos seus vizinhos asiáticos. Para nós europeus, sobretudo aqueles que acreditam na estabilidade de instituições como a NATO e a União Europeia, que valorizam um possível acordo de comércio livre com os Estados Unidos ou que estão assustados com a ascensão do nacionalismo e do populismo na Europa, é sobretudo preocupante verificar que um líder dos Estados Unidos elogia abertamente movimentos populistas como o de Nigel Farage ou Marine Le Pen, que ameaça a indústria europeia com novas barreiras alfandegárias e que ataca a União Europeia, dizendo até que mais países deverão abandonar a UE.

 

Mas prefiro centrar este artigo nas barreiras que Trump terá para impor a agenda que tem apregoado. Não sei se será possível ter sequer algum tipo de optimismo. Muito provavelmente tudo correrá mal e Trump continuará a actuar como Presidente com este estilo bombástico e de desprezo pelos valores e pelos ideais que os Estados Unidos sempre representaram no Mundo. Nas últimas semanas, alguns nomeados de Trump e que terão fortes responsabilidades na condução da política externa norte-americana, teceram declarações que representam alguns bons sinais, entrando em contradição frontal com Trump.

 

Esta semana Nikki Haley, nomeada para Embaixadora dos Estados Unidos na ONU, disse que a Rússia não é confiável, condenou a invasão da Crimeia, criticou a intervenção russa na Síria e discordou do levantamento das sanções a este país enquanto não oferecer nada em troca. E, ao mesmo tempo que condenou a posição de Obama em relação à condenação de Israel na ONU no mês passado (tal como aliás o Partido Republicano e muitos senadores Democratas), defendeu a solução de dois estados para Israel e Palestina.

 

Mais surpreendente foram as declarações de Rex Tillerson na audição no Senado para Secretário de Estado e que terá, inclusive, suscitado algum desânimo em Moscovo. O antigo CEO da Exxon Mobil, considerado próximo da Rússia, afirmou que esta representa um perigo, que invadiu a Crimeia é ilegal, que apoiou as forças sírias que de forma brutal violaram as leis da guerra e acrescentou ainda que os aliados da NATO estão certos ao terem receio da Rússia. E acrescentou ainda que é necessário promover uma reconciliação com a Turquia, que devido à ausência de uma verdadeira liderança americana, aproximou-se da Rússia. Tillerson pronunciou-se ainda sobre os ataques cibernéticos russos, ao afirmar que são preocupantes, ao mesmo tempo que propôs medidas para apoiar a Ucrânia, nomeadamente através da cedência de armas. Mas Tillerson disse ainda outras coisas, como não se opor ao Acordo de Comércio Livre com a Ásia-Pacífico (TPP) e apoiar genericamente acordos de comércio livre. Não é certo que Tillerson seja aprovado no senado, até porque vários republicanos têm várias reservas à sua nomeação, como Marco Rubio, John McCain e Lindsay Graham. Mas desde que foi conhecido que é apoiado por figuras como Condoleezza Rice do Robert Gates, as suas hipóteses aumentaram e talvez estes apoios também signifiquem que não vá ser um simples yes man da absurda retórica de Trump.

 

James Mathis, que foi esta quarta-feira confirmado como novo Secretário da Defesa no senado (26 votos a favor, 1 contra), também entrou em contradição com as ideias de Trump, dizendo mesmo que a Rússia e o ISIS são as grandes ameaças externas aos Estados Unidos, surpreendendo ao ponto de afirmar que são os russos a principal ameaça. O general Mathis, que trabalhou na NATO, defendeu também a importância da aliança atlântica e acusou a Rússia de pretender “destruir a aliança militar de maior sucesso da história”, reforçando a ideia que é fundamental a defesa dos países bálticos e travar a ameaça russa. No mesmo dia, Mathis foi secundado em muitas destas opiniões por Mike Pompeo, novo director da CIA.

 

É evidente que muitas destas declarações não podem ser desligadas do local onde foram feitas: no Senado, onde precisavam de convencer os senadores a aprovarem a sua nomeação. Seja verdade (no caso de Nikki Haley, Mike Pompeo e James Mathis é, pois sempre defenderam isso) ou mentira (ninguém conhecia o pensamento de Rex Tillerson sobre estas matérias), estes nomeados tiveram a necessidade de enfatizar estas posições no Senado precisamente porque são as opiniões da maioria dos senadores, sejam republicanos ou democratas. E isso revela a dificuldade que Trump terá em impor a sua agenda disruptiva na política externa norte-americana: grande parte dos eleitos a nível federal nos EUA discordam veementemente das ideias de Trump e o establishment dos dois partidos também. Sabemos que isso não impediu Trump de vencer as eleições, e apesar do que defendem os escolhidos para o Pentágono, Langley, ONU ou Departamento de Estado, terão eles capacidade de influenciar decisivamente Trump? Provavelmente a resposta é não e a política externa dependerá quase exclusivamente dos interesses e dos desejos do novo presidente. Mas se ninguém conseguir influenciar positivamente a agenda da Administração Trump, então provavelmente teremos razões para estar muito preocupados com os próximos quatro anos.


12
Jan 17
publicado por Nuno Gouveia, às 00:46link do post | comentar | ver comentários (1)

 

“If Putin likes Donald Trump, I consider that an asset, not a liability.”

 

Ter um Presidente a falar dele próprio na terceira pessoa é mais uma novidade. Mas esta frase revela muito do que a presidência Trump pode representar para os Estados Unidos e para o Mundo. Se Trump acredita que Putin gosta mesmo dele e que por isso vai deixar de defender os interesses da Rússia (e tantas vezes antagónicos dos Estados Unidos e dos seus aliados), é um perigoso ingénuo. Se diz estas coisas sem pensar nelas apenas para enganar as pessoas, então é um perigoso pateta alegre. 

Não sou daqueles que considera que Obama teve um mandato excepcional. Bem pelo contrário, penso que na frente externa, e isso é o que mais relevo, Obama fracassou e deixou um mundo é bem mais perigoso daquele que encontrou em 2008. O “Lead from behind” foi um fiasco na Líbia e no Médio Oriente e o “reset button” com a Rússia permitiu a Putin fazer o que bem entendeu na Ucrânia e na Síria. Mas Obama não criou nenhuma disrupção na política externa americana das últimas décadas e desempenhou um papel importante para os seus aliados. Manteve a democracia americana como um exemplo e promoveu os valores da liberdade e da democracia. Mas Trump ameaça este legado. A conferência de imprensa dele de ontem deixou sérios avisos (como em toda a campanha) que a democracia americana vai ter lutar muito para manter a sua vitalidade.

Nesta sua primeira conferência de imprensa depois de ter sido eleito, e após semanas a criticar os serviços de inteligência (não me recordo de ver um presidente criticar e enfraquecer desta forma os serviços de espionagem) sobre os hackers russos, Trump hoje lá admitiu que provavelmente tinham sido os russos. Mas é inacreditável que ele próprio, que já tinha tido acesso às provas que a CIA lhe tinha mostrado, mesmo assim tenha continuado a negar esta evidência. Até hoje. Poderá cumprir eficazmente a sua função de Presidente quando não confia nos serviços de inteligência e que estes próprios desconfiam do Presidente? Será que Trump vai confiar nas informações dos “nazis” da CIA?

Trump continuou nesta conferência de imprensa a alimentar a fábula que o México vai pagar a construção muro da fronteira, mas que não vai esperar que eles o assumam, e que apenas irão reembolsar os Estados Unidos à posterior. Devia ouvir ou ler o que diz o antigo Presidente mexicano Vicent Fox sobre esta matéria. Aprenderia alguma coisa.

Como candidato a déspota, atacou a CNN e ameaçou colocar um jornalista fora da sala. Para perceber esta polémica, a CNN publicou uma noticia sobre relatórios dos serviços de inteligência sobre a sua relação com a Rússia de Putin, mas ao contrário do site Buzzfeed, a CNN não publicou informações não confirmadas. Mas se Trump não responde a meios de comunicação social que publicam noticias desagradáveis, provavelmente acabará o mandato a falar apenas para a Fox News, Drudge e Breitbart. Muito mau sinal para a liberdade de imprensa.

Destaque também para a política económica de Trump, que parece ser uma espécie de mistura entre populismo e socialismo económico e que devia envergonhar o Partido Republicano. A imposição de taxas aduaneiras às empresas que produzem fora dos Estados Unidos, aliada ao proteccionismo económico e oposição aos acordos de comércio livre, como a NAFTA e o TPP (que por acaso hoje teve um defensor em Rex Tillerson), permite-nos esperar uma política económica perigosa para os Estados Unidos, mas também para o Mundo. A frase “vou ser o maior criador de empregos que Deus alguma vez criou” poderia ter sido dito por um qualquer líder soviético, mas não, foi Donald Trump, líder do Partido Republicano de Reagan, que defendia que são “as pessoas e não o governo produz crescimento económico e emprego”.

Trump é algo de novo na política norte-americana. Tem-no sido desde o anúncio da sua candidatura presidencial, que tantos ignoraram e desvalorizaram (eu fui um deles). Tem baixado o nível do debate político e poderá ser um perigo para a democracia americana. Nos próximos quatro anos veremos se surprende pela positiva ou corresponde às baixas expectativas.

 

PS: a nove dias da tomada de posse de Trump, começo uma série de textos sobre a sua presidência.


21
Jul 16
publicado por Nuno Gouveia, às 21:13link do post | comentar | ver comentários (9)

 

Ted Cruz está nos antípodas do que defendo. Aliás, a sua carreira política desde 2012 está intimamente ligada ao descalabro em que caiu o Partido Republicano. Assumiu posições polémicas e muito longe do centro-direita que defendo. Mas ontem conquistou algum do meu respeito, ao deslocar-se à Convenção do Partido Republicano e ter proferido um discurso anti-Trump (sim, defendeu algumas coisas que discordo) em que muitas passagens estão de acordo com o conservadorismo tradicional americano, como o respeito pela liberdade religiosa e pelos diferentes credos (ou ateísmo, como ele referiu) ou na defesa da liberdade individual e das minorias contra o poder dos aprendizes de tiranos. Até teve algumas passagens contra o divisionismo da sociedade americana para que ele tanto tem contribuído. Não sei se terá sido um mea culpa. Mas o grande momento (diría único) da sua carreira foi ontem, quando perante assobios de uma assistência de "Trumpians" recusou-se a apoiar Trump e defendeu que as pessoas deviam votar segundo a sua consciência. Saiu sob um ruidoso coro de criticas, mas um dia poderá dizer que não pactuou com Trump. Muitos outros republicanos não poderão dizer o mesmo. E apesar de esperar que Cruz nunca venha a ser o líder do Partido Republicano, ontem esteve bem e merece o meu aplauso. Dizer não a um proto-tirano na sua cara nunca é fácil, mas Cruz fê-lo. Não deixa de ser sintomático que até a sua esposa teve de ser escoltada para sair da Convenção, pois estava a ser alvo da fúria dos "Trumpidians". Eu, que estive nas duas últimas convenções republicanas, lamento profundamente o circo de horrores que está a ser esta convenção. Que em Novembro Trump tenha uma derrota avassaladora é o meu único desejo.

 

 
 

04
Mai 16
publicado por Nuno Gouveia, às 20:34link do post | comentar | ver comentários (11)

A democracia liberal americana sofreu um duro revés com um dos seus dois maiores partidos a ser capturado por um populista demagogo como Donald Trump. Não tenhamos ilusões: este já não é o partido de Reagan e a partir de agora será uma outra coisa bem diferente. Resta saber se em caso de derrota em Novembro se poderá salvar ou continuará com esta linha. Tudo permanece incerto e não me arrisco a fazer prognósticos. A nomeação garantida ontem por Trump marca o fim de uma era no Partido Republicano, marcada pelo conservadorismo social, liberalismo económico e uma ideia de Estados Unidos intervencionista no mundo. Donald Trump não é conservador, não respeita a liberdade económica e a sua posição externa dependerá muito dos seus estados de alma. Como dizia há dias um conservador americano, o Partido Republicano de Trump é algo muito semelhante à Frente Nacional, com um discurso xenófobo e misógino, contra os estrangeiros e tudo o que "cheire" a diferente. Tanto tomará posições à esquerda, como no proteccionismo económico que tem vindo a defender, como radizalizará à direita, como são as suas posições demagogas sobre os imigrantes.

 

Donald Trump "suspendeu" o Partido Republicano moderno. É verdade que nos últimos anos, o radicalismo tomou conta de várias franjas do partido, e havia vários sinais disso. Mas se atentarmos aos dois últimos nomeados, a liderança do partido não tinha mudado assim tanto. John McCain e Mitt Romney não eram assim tão diferentes, em termos ideológicos, de Ronald Reagan ou dos Bush, os três últimos presidentes republicanos. Mas o que se passou nestas primárias foi um verdadeiro filme de terror com esta mudança radical na liderança do GOP, que concretizou os sintomas dos últimos anos: figuras com Sarah Palin e Michele Bachmann chegaram a ser imensamente populares na base do partido; apresentadores radicais de rádio, como Sean Hannity, Rush Limbaugh ou Laura Ingraham são vozes autorizadas na base do partido. A grande surpresa foi que estes que se clamavam representantes do "verdadeiro conservadorismo" não apoiaram o candidato que aspirava a ser o verdadeiro conservador nas primárias, o senador Ted Cruz. Não, os mesmos que juraram durante anos fidelidade ao verdadeiro conservadorismo acabaram por apoiar um antigo democrata que doara centenas de milhares de dólares aos democratas e aos Clinton, e que sempre assumira posições contra os conservadores até há bem poucos anos. Os demagogos e os puristas são sempre assim: o seu oportunismo acaba sempre por se revelar. 

 

O Partido Republicano partiu para esta campanha eleitoral cheio de esperanças depois da vitória eleitoral nas eleições intercalares de 2014. Depois de oito anos de Barack Obama na Casa Branca, as expectativas de recuperar a Presidência eram legítimas. Um partido cheio de novas caras capazes de entusiasmar a sociedade americana: desde o jovem descendente de cubanos, Marco Rubio ao governador estrela do “blue state” Wisconsin que tinha “dobrado” a espinha aos sindicatos e ganho três eleições em quatro anos, Scott Walker. Ao lado, candidatos credíveis e tradicionais, como Jeb Bush, do poderoso clã que já deu dois presidentes à América, e John Kasich, o influente e popular governador do Ohio. Historicamente, as perspetivas eram ainda melhores. Desde a saída de Harry Truman em 1952 que o Partido Democrata não consegue ter dois presidentes consecutivos e desde então, apenas uma vez um partido venceu três eleições consecutivas, entre 1980 e 1988, com Ronald Reagan e George H. Bush. Do outro lado, uma agastada Hillary Clinton, afetada por diversos escândalos, era a única candidata viável, depois de oito anos de Obama em que a única “estrela” que apareceu, Elisabeth Warren, rapidamente anunciou que não seria candidata. Estava tudo reunido para o que o Partido Republicano tivesse fortes hipóteses de vencer as eleições presidenciais de 2016, com um candidato credível e capaz de regenerar um partido ainda agastado pela presidência de George W. Bush. 

 

Se depois do que aconteceu nos últimos meses, não digo que Trump está destinado a ser derrotado (devemos aprender lições do passado), mas ele parte para estas eleições muito fragilizado, sendo o candidato mais impopular de sempre a chegar às eleições gerais e parte muito atrás de Hillary Clinton, como indicam quase todas as sondagens. Mas este Partido Republicano de Trump não é conservador nem liberal (no sentido americano). É populista e demagogo, e agirá sempre de acordo com os estados de alma de Trump. E nada é mais perigoso que um grande partido num grande país ser dominado por um populista. 

 

PS: Com a nomeação de Trump, veremos muitos que o renegaram nestes últimos meses a colocarem-se atrás dele. A vida partidária é assim mesmo.

 


21
Mar 16
publicado por Nuno Gouveia, às 21:35link do post | comentar | ver comentários (4)

As primárias republicanas de 2016 podem terminar com uma "convenção contestada", algo que não sucede desde 1976, quando Gerald Ford chegou à convenção de Kansas City sem os delegados necessários para obter a nomeação na primeira votação. No Partido Democrata, a última vez que tal aconteceu foi em 1980, numa disputa ganha pelo Presidente Jimmy Carter contra o senador Ted Kennedy. Se na era moderna da política americana este fenómeno é muito invulgar, até à introdução generalizada das primárias da década de 70, depois da reforma McGovern-Fraser, era mais comum. As lendárias convenções decididas pelos "party bosses" em "smoke-filled room" eram habituais, com as decisões a serem tomadas à porta fechada*. Para tal acontecer este ano, nenhum candidato pode atingir os 1237 delegados, o que é possível, pois ao contrário de outros anos, Donald Trump vai ter oposição até ao final das primárias. Apesar de me parecer que Trump deverá mesmo chegar muito perto desse número, se não o ultrapassar mesmo, este é um cenário em que vários republicanos do movimento #NeverTrump estão a trabalhar para impedir o milionário nova iorquino de se transformar no líder republicano. Se Trump não conseguir obter os 1237 delegados na primeira votação na Convenção de Cleveland, então os seus delegados vão se libertando da obrigação de votarem nele e tudo pode acontecer. Mesmo nomear um candidato que não tenha tido a votos nestas primárias. Improvável mas não impossível. E é nisso que apostam os seus opositores no Partido Republicano. 

Em 1976, o presidente Gerald Ford chegou à convenção à frente mas sem os 1130 delegados necessários para vencer a nomeação à primeira votação. Ronald Reagan, antigo governador da Califórnia, chega a Kansas City com a aspiração de derrotar o Presidente e anuncia que o seu candidato a vice presidente seria o senador da Pensilvânia, Richard Schweiker, para convencer a ala moderada do partido a apoiá-lo. O problema para Reagan foi que os conservadores não gostaram da sua escolha e muitos deles decidiram apoiar Ford, que ganhou a nomeação com 1187 delegados contra os 1070 de Reagan. Depois de perder a votação, Reagan declarou o apoio a Ford, terminando com a frase "There is no substitute for victory, Mr President". Gerald Ford perdeu para Jimmy Carter e passado quatro anos, na convenção de Detroit, tentou negociar a sua entrada no ticket republicano como Vice Presidente de Reagan. O acordo chegou mesmo a estar quase concluído, mas Reagan à última hora optou por George H. Bush. 

1952 foi um ano em grande para as convenções contestadas. No lado do Partido Republicano, Robert Taft e Dwight Eisenhower defrontaram-se na Convenção de Chicago, não para escolher o nomeado republicano, mas sim para escolher o Presidente. Depois de 20 anos de domínio democrata e com a popularidade do Presidente Harry Truman pelas ruas da amargura, era quase certo que o Partido Republicano iria recuperar a Casa Branca. Foi também um confronto entre os centristas e os conservadores, uma réplica da história da década anterior e posterior no GOP. Thomas Dewey, nomeado republicano em 1944 e 1948, optou por não se candidatar, mas conseguiu convencer o herói da II Guerra Mundial, o general Dwight Eisenhower, a candidatar-se pela ala moderada (curiosamente, também tinha sido "namorado" pelo Partido Democrata). Robert Taft, representante da ala conservadora do partido, tentou pela última vez ser o nomeado contra os moderados. Esta foi uma convenção cheia de truques de ambos os lados, com Einsenhower a ganhar na primeira votação com 845 votos contra 280 de Taft. No entanto, no inicio da Convenção o número de delegados era muito equilibrado, mas as manobras na convenção fizeram pender a vitória para o general. Para equilibrar o ticket, o Einsenhower nomeou um jovem senador da Califórnia, Richard Nixon. Também em Chicago, o Partido Democrata reuniu-se para escolher o sucessor de Harry Truman. E foi a última vez que nenhum partido escolheu o seu candidato à primeira. Nas duas primeiras votações, o senador do Tennessee, Estes Kefauver liderou, sem no entanto chegar à maioria dos delegados. Mas o governador do Illinois, Adlai Stevenson, que nem sequer era candidato no inicio da convenção, cedeu aos esforços de alguns party bosses e avançou para a luta pela nomeação. Apesar de destroçado popularmente, o apoio de Harry Truman viria a ser decisivo para a vitória de Adlai Stevenson na terceira votação. Passado quatro anos, voltaria a ser candidato e derrotado nas presidenciais de 1956. 

Muitas mais histórias de ambos os partidos haveria para contar. A mais conhecida do grande público, até pelo excelente livro de Doris Kearns Goodwin, Team Rivals, foi em 1860 na segunda convenção da história do Partido Republicano, quando o desconhecido Abraham Lincoln derrotou os favoritos William H. Seward, Salmon P. Chase e Edward Bates. A mais longa de todas foi no Partido Democrata em 1924, quando foram necessárias 103 votações para escolher John W. Davis, que derrotou o candidato apoiado pelo Ku Klux Klan William G. McAdoo, que chegou a ter 47% dos delegados na 77ª votação. Com uma furiosa oposição do governador de Nova Iorque, o católico Al Smith, Davis acabou por ser o candidato da reconciliação,

 

* Sobre este tópico aconselho o filme "The Best Man", escrito por Gore Vidal e realizado por Franklin Schaffner com Henry Fonda. 


12
Mar 16
publicado por Nuno Gouveia, às 10:00link do post | comentar | ver comentários (9)

Nem estas intervenções, de grande qualidade de Ted Cruz e Marco Rubio, salvam a honra do Partido Republicano. Donald Trump, o provável nomeado do partido, está a levar o partido de Abraham Lincoln e Ronald Reagan para a extrema-direita xenófoba e populista. Será que o GOP tem salvação? Tenho muitas dúvidas. 

 


03
Mar 16
publicado por Nuno Gouveia, às 22:37link do post | comentar | ver comentários (7)

 

A nomeação de Donald Trump ainda não é uma realidade, mas depois dos resultados que já obteve e das sondagens conhecidas, é difícil encontrar um cenário em que não seja ele a acumular mais delegados até Junho. Aliás, o cenário de outro candidato atingir os delegados necessários para obter a nomeação antes da convenção é quase impossível. A única forma de impedir Trump de ser o nomeado republicano na Convenção de Cleveland será impedir que ele atinja os 1237 delegados e partir para uma "Brokered Convention". Neste cenário, caso nenhum dos candidatos atinja esses votos na primeira votação, voltaria a repetir-se a votação, mas já sem a obrigação das delegações votarem conforme os resultados eleitorais das primárias. Esse é o cenário mais plausível (e mesmo assim, pouco provável) de derrotar Trump.

 

É com este cenário que começa-se a formar-se um bloco conservador anti-Trump, apelando ao voto nos restantes três candidatos - Marco Rubio, John Kasich e Ted Cruz. Hoje Mitt Romney, anterior nomeado republicano, discursou perante o povo americano (os canais noticiosos cobriram em direto a sua intervenção), fazendo um apelo ao voto nos três candidatos, mediante o estado em disputa. Num emotivo e duro discurso, Romney repetiu alguns argumentos populares na direita americana contra Trump, alertando para os riscos que o movimento conservador americano incorrerá caso Trump seja o nomeado. Romney afirmou que Trump é uma "fraude" que tenta fazer dos americanos parvos e que uma vitória sua colocaria os Estados Unidos em risco, criando uma guerra comercial e fazendo entrar o país em recessão. Não deixou de atacar também o carácter xenófobo e misógino de Trump, dando os exemplos dos ataques aos mexicanos, aos muçulmanos e às mulheres. Romney afirmou mesmo que a integridade e a decência da democracia americana está em causa nestas eleições. Minutos depois, John McCain, nomeado republicano em 2008, disse que concordava com Romney e apelou à derrota de Trump.

 

Vários republicanos já afirmaram em público que nunca irão votar em Trump nas eleições gerais. Alguns eleitos, como o Governador do Massachusetts, Charlie Baker e o Senador do Nebraska, Ben Sasse, diversos congressistas e antigos governadores, como Tom Ridge da Pensilvânia e Christine Todd do New Jersey e algumas personalidades dos media, como Glenn Beck, Bill Kristol, Erick Erickson ou Peter Wehner. E depois da intervenção de Romney, será virtualmente impossível que ele não se junte ao movimento criado nas redes sociais #NeverTrump. Parece-me que esta revolta que temos assistido nas últimas semanas tem tido o efeito de suster o crescimento de Trump. Apesar de tudo, tem tido melhores sondagens do que resultados e na Super Terça-Feira apenas teve 35% dos votos, enquanto as sondagens apontavam para resultados bem melhores. Mas a falta da união na frente anti-Trump tem-lhe permitido ganhar e provavelmente irá continuar a ganhar. Diria que esta revolta devia ter aparecido antes das eleições começarem, pois parece-me que agora é tarde para parar Trump. 

 

O que isto significa para o Partido Republicano? O cenário mais provável neste momento é uma nomeação de Trump, com um clima de guerra civil dentro do partido. Mesmo que muitos dos que se têm oposto publicamente (ou nos bastidores, como o Speaker Paul Ryan e o Líder da Maioria no Senado, Mitch McConnell) acabem por declarar o seu apoio a Trump mais lá para frente, será um partido profundamente dividido que enfrentará Hillary Clinton. Caso venhamos a enfrentar uma "Brokered Convention", os apoiantes de Trump irão criar um clima de guerrilha nas ruas de Cleveland, que já há muitos a recordar os tumultos de 1968 na Convenção Democrata de Detroit. Hillary Clinton tem bons motivos para sorrir perante este caos no Partido Republicano.


01
Mar 16
publicado por Nuno Gouveia, às 21:59link do post | comentar

Um comentário meu à Rádio Universitária do Minho sobre as eleições de hoje nos Estados Unidos. 


publicado por Nuno Gouveia, às 19:56link do post | comentar

Um brilhante manifesto anti-Trump do comediante John Oliver. Este é o provável nomeado do Partido Republicano. 

 

 


27
Fev 16
publicado por Nuno Gouveia, às 09:00link do post | comentar | ver comentários (2)

As campanhas presidenciais americanas têm muitas regras não escritas que normalmente funcionam. Mas Trump está a revolucionar a política presidencial e todas têm vindo a ser derrubadas. Bem, todas menos uma regra fundamental: quem vence as primeiras eleições, normalmente conquista uma dinâmica de vitória capturando um apoio exponencial nas eleições seguintes. A única vez que tal não sucedeu foi em 1992 no Partido Democrata, quando o nomeado, Bill Clinton, apenas ganhou a sua primeira eleição (e mesmo assim, única nesse dia) na super terça-feira. De resto, sempre que alguém ganha o estatuto de frontrunner após as primeiras eleições, acaba por ser o nomeado. Trump tem cometido gaffes atrás de gaffes, proferido declarações bombásticas, demonstrado uma total ignorância sobre os princiais dossiês, feito propostas simplesmente inexequíveis, tem sido largamente ultrapassado nos gastos financeiros pelos seus adversários, declarou guerra à Fox News e é o candidato que tem menos apoios no Partido. Nesta fase, tudo isto significaria que não teria a mínima hipótese. E, no entanto, é o óbvio frontrunner e favorito para obter a nomeação. Será muito difícil travá-lo.

No debate desta quinta-feira Marco Rubio e Ted Cruz finalmente partiram ao ataque contra Trump, expondo as suas óbvias fragilidades como candidato. A crítica americana foi quase unânime em declarar que, pela primeira vez nesta campanha presidencial, Trump foi ridicularizado num debate e que a dupla Rubio/Cruz foi eficaz ao irem atrás do nova iorquino. Mas a mesma crítica também manifestou sérias dúvidas se este ataque frontal a Trump não terá sido demasiado tarde, pois o "momentum" de Trump parece ser quase imparável. E ontem, depois de uma manhã desastrosa nos media, Trump apresentou ao inicio da tarde o apoio de Chris Christie, que quebrou com a cobertura do debate. É verdade que finalmente as Super Pacs estão a atacar Trump (a de Rubio angariou 20 milhões de dólares esta semana para esse objetivo), mas também pode ser tarde demais. Um dos grandes mistérios destas eleições é que dos mais de 200 milhões de dólares já gastos nestas primárias em anúncios televisivos, apenas uma ínfima parte desse dinheiro foi gasto contra Trump. O maior alvo foi mesmo Marco Rubio, que foi massacrado por Jeb Bush, Chris Christie e Ted Cruz. Hoje no Twitter famosos activistas conservadores atacaram Trump e há uma revolta contra a possibilidade da sua nomeação. Mas se há umas semanas tivesse que apostar, colocaria o meu dinheiro num candidato que não Trump, neste momento, e pelo que tenho visto nas sondagens dos próximos estados, já não o faria.

A menos que o debate tenha mudado alguma coisa, Trump deverá vencer a maioria dos estados na próxima terça-feira (acredito que se tiver uma "má" noite, terá mesmo assim mais de 50% dos delegados em disputa) e se conseguir fazê-lo no Texas, Ted Cruz poderá mesmo ver-se obrigado a desistir (neste momento, Cruz vai à frente). Rubio poderá ficar em segundo na maior parte dos estados, mas caso não vença nenhum, que hipóteses terá? Vencer a maior parte dos estados que atribuem os delegados todos ao vencedor? Talvez, mas conseguirá vencê-los, contrariando a única regra que ainda não foi quebrada nestas primárias? Não me parece... Mas estas não são umas primárias iguais às que já vimos no passado, por isso, nunca se sabe. 

 

PS: hoje realizam-se as primárias da Carolina do Sul no Partido Democrata e Hillary Clinton é a clara favorita. Depois de algum momentum de Bernie Sanders, diria que a menos mude alguma coisa, Clinton deverá fechar a sua nomeação na super terça-feira. O #FeelTheBern caiu muito esta semana. 


20
Fev 16
publicado por Nuno Gouveia, às 00:34link do post | comentar

Amanhã realizam-se importantes eleições: na Carolina do Sul no Partido Republicano e no Nevada no Partido Democrata. Não são decisivas, mas podem ditar o afastamento da corrida de alguns candidatos no lado do Partido Republicano, e contribuir para que Bernie Sanders possa afirmar-se como sério candidato à nomeação. 

 

Primárias da Carolina do Sul - 50 delegados no Partido Republicano (urnas encerram às 01h00 Domingo) 

Os vencedores dos sete distritos ficam com três delegados em cada e 29 serão atribuídos ao vencedor do estado. Na prática, se um candidato vencer nos sete distritos fica com os 50 delegados. É esperada nova vitória de Donald Trump, pois lidera as últimas dez sondagens no Estado, mas nos últimos dias os seus números têm descido. Ontem foi publicada uma que colocava Ted Cruz a apenas cinco pontos e hoje outra que colocava Marco Rubio apenas a três pontos. Mas a maioria coloca Trump acima dos 30%, com Rubio e Cruz a disputarem o segundo lugar. Jeb Bush e John Kasich disputam o quarto lugar e Ben Carson aparece em todas em último lugar. As indicações que têm surgido nos últimos dias apontam para uma desistência de Jeb Bush, caso fique atrás de Rubio e Ben Carson poderá não continuar se o seu resultado ficar abaixo dos 5%. Kasich parece determinado continuar até às primárias do Midwest, que acontecerão lá para o inicio da Primavera. Se Trump tiver mais uma vitória confortável, ficará em excelente posição para vencer no Nevada no dia 23 deste mês e com caminho aberto para a Super Terça-feira. Depois do péssimo quinto lugar no New Hampshire, Marco Rubio parece ter recuperado na Carolina do Sul e com os importantes apoios da popular Governadora Nikki Haley e o Senador Tim Scott tem subido nas sondagens. A sua campanha está em crescendo, mas precisa de ter excelente resultado aqui, e desta vez, um terceiro lugar poderá não ser suficiente. Continua a ter hipóteses de ganhar a nomeação mas precisa urgentemente que Kasich e Bush se retirem para ficar como o candidato único do establishment. Ted Cruz espera repetir a surpresa do Iowa, e caso não o consiga, precisa de ficar em segundo. Um terceiro lugar atrás de Rubio coloca-o em maus lençóis.

 

Caucus do Nevada - 43 delegados no Partido Democrata (começam às 18h00 de Lisboa) 

Os delegados são atribuídos proporcionalmente aos resultados. As sondagens no Nevada não são muito fiáveis e há a longa tradição de falharem. Por exemplo, em 2008 Mitt Romney tinha uma vantagem de 5 pontos sobre John McCain e acabou por vencer por 30 pontos. Talvez por isso não há muitas sondagens no Nevada, mas as três que foram conhecidas depois das primárias do New Hampshire colocam Hillary Clinton e Bernie Sanders num empate técnico, com ligeira vantagem para a antiga Secretária de Estado. Isto é particularmente relevante pois em Dezembro, Hillary tinha uma vantagem que oscilava entre os 20 e os 30 pontos. Esta eleição é importante para Bernie, pois tem suscitado um enorme entusiasmo entre os mais jovens, mas não demonstrou ainda que consegue conquistar importantes grupos demográficos nas primárias democráticas: os negros e os hispânicos. Ora, é expectável que cerca de 30% dos eleitores sejam hispânicos e negros, o que pode ajudar Bernie a mostrar que também pode vencer entre as minorias. Até ao momento, Hillary Clinton acredita que tem a eleição controlada na Carolina do Sul (que se realiza na próxima terça-feira), pois o enorme apoio que têm entre os negros não dá mostras de quebrar aí. Olhando para os números conhecidos, creio que mesmo que Hillary Clinton perca no Nevada, vencerá facilmente na Carolina do Sul, onde a percentagem de negros ultrapassa os 50%. Além disso, esta semana saiu uma sondagem da PPP nos estados da Super Terça-feira, que colocava Hillary a vencer em 10 dos 12 estados. Se isso se mantiver assim, pode arrumar com a questão nesse dia. Mas tudo está em aberto e se Bernie vencer no Nevada e ficar próximo na Carolina do Sul, o resultado é imprevisível. Diria que Clinton continua a ser muito favorita, mas as coisas podem mudar um pouco depois dos resultados de amanhã.

 


16
Fev 16
publicado por Nuno Gouveia, às 22:21link do post | comentar | ver comentários (8)

Nunca na história moderna do sistema político americano - desde 1976, quando o sistema de primárias como hoje vigora foi instituído - nenhum republicano foi nomeado sem vencer uma das três primeiras eleições. Depois da vitória de Ted Cruz no Iowa e Donald Trump no New Hampshire, a menos de uma semana das eleições na Carolina do Sul, todas as sondagens dão uma confortável vantagem a Trump. Se isto fosse um ano normal, não tenho dúvidas que o candidato Trump estaria com a nomeação praticamente ganha se vencesse, como é esperado, na Carolina do Sul. Mas isto não é um ano normal nem Trump é um candidato convencional. As elites republicanas estão em choque com a possibilidade de entregar a liderança do seu partido ao multimilionário e, igualmente assustados, que Ted Cruz esteja em segundo lugar nestas primárias. Considerados inelegíveis por muitos, a nomeação de Trump (e em menor grau, de Cruz), significaria um duro revés para a credibilidade de um partido que nos últimos anos tem-se afastado para a direita (tal como o Partido Democrata para a esquerda, como se vê pela popularidade de Bernie Sanders). Nomear Trump seria entregar o partido a um oportunista xenófobo e populista, que em muitos discursos faz lembrar a extrema-direita clássica europeia. Nomear Cruz, que é detestado pelos seus colegas no Senado, poderia significar ter o candidato mais à direita desde 1964, quando Barry Goldwater foi arrasado nas urnas por Lyndon Johnson. 

 

Se olharmos para os resultados do New Hampshire, as votações conjuntas de Bush, Rubio, Kasich e Christie, a soma ultrapassaria Trump. Nas sondagens da Carolina do Sul, estariam mais ou menos empatados e nas nacionais o mesmo. O que isto quer dizer? Se quiserem derrotar Donald Trump, os republicanos vão ter de se unirem rapidamente em redor de um destes candidatos. Não quer isso dizer que haverá uma transferência imediata das intenções de voto para este candidato, mas essa é a melhor hipótese de travar Trump. O problema para o GOP é que até ao momento, nenhum destes três tem razões para abandonar a corrida, pois têm a legítima esperança de ser o último dos três. Rubio tem a melhor campanha, mais apoios e a legítima expectativa de ser o opositor de Trump. Kasich, depois do segundo lugar no New Hampshire, não pode desistir. E Bush, bem, depois de já ter gasto mais de 100 milhões de dólares nesta campanha, vai continuar enquanto houver uma esperança de derrotar os seus adversários directos. Se os resultados do próximo sábado forem próximos entre estes três, e nenhum desistir, então a super terça-feira arrisca-se a ser um passeio para Trump, e aí sim, poderá tornar-se imparável. A dinâmica das campanhas presidenciais americanas diz-nos que depois de obter tantas vitórias seguidas, é quase impossível parar esse candidato. E não sei se Trump emergir na super terça-feira como grande vencedor, o conseguirão parar, mesmo que a campanha a partir daí fique reduzida a três ou até a dois candidatos, caso Ted Cruz também abandone a corrida.

 

Trump não é imparável, e não será uma vitória no próximo sábado que irá mudar esse cenário. Mas só uma corrida a dois ou a três, poderá neste momento parar o nova-iorquino. E quanto mais rápido isso suceder, maiores as possibilidades de derrotar Trump.


09
Fev 16
publicado por Nuno Gouveia, às 22:10link do post | comentar | ver comentários (2)

 

1 - Se parece haver poucas dúvidas sobre as vitórias de Bernie Sanders e Donald Trump (as sondagens levariam um rombo de proporções épicas), qual será a margem para ambos? Isso poderá ser importante para o que se vai dizer destes resultados. 

2 - Como irá Hillary Clinton reagir depois destas primárias? Será que vai anunciar alterações na sua estrutura de campanha? Vai mudar de estratégia e começar a atacar frontalmente Sanders? 

3 - Quem ficará em segundo lugar nas primárias republicanas? Há dias, Marco Rubio era o claro favorito, mas depois da sua prestação no debate do sábado passado, caiu nas sondagens. Diria que há três fortes candidatos, além de Rubio: John Kasich, que tem apresentado valores seguros, Jeb Bush, que apareceu ontem numa sondagem em segundo lugar e Ted Cruz, que manteve-se sempre próximo do segundo lugar. 

4 - Quem irá desistir depois desta noite? Apostaria em Chris Christie, que praticamente só fez campanha neste estado e se ficar atrás dos três governadores, nada mais terá a fazer nesta campanha. Carly Fiorina é também uma forte candidata se as sondagens se confirmarem. Ben Carson poderá tentar ficar, mas a sua campanha já está literalmente morta. Se Bush ou Kasich desiludirem, também dificilmente continuarão. Mas não apostaria nisso. 

5 - Qual será a grande surpresa desta noite? Já estamos habituados a surpresas em noites eleitorais de primárias e esta não deverá fugir à regra. Teremos esta noite um "comeback kid", como em 1992 com Bill Clinton ou em 2008 com John McCain? Se sim, o mais sério candidato será Jeb Bush, que pode renascer hoje. Mas atenção a John Kasich.


06
Fev 16
publicado por Nuno Gouveia, às 22:22link do post | comentar | ver comentários (1)

Estamos a três dias das primárias do New Hampshire e já se podem retirar ilações dos resultados do Iowa. Esta noite ainda teremos, a partir das 01h00 (de Lisboa), um debate republicano transmitido pela ABC, mas mesmo acreditando que poderá haver alterações nos próximos três dias, será difícil que Bernie Sanders e Donald Trump não saiam vencedores na terça-feira. 

Bernie Sanders continua a surpreender, e depois do empate técnico que alcançou no Iowa, a sua situação melhorou. No New Hampshire, e apesar de uma ligeira recuperação de Hillary Clinton, deverá alcançar uma vitória confortável, que o poderá catapultar para outros voos. A sua vitória não parece estar  em causa, mas a diferença vai ser relevante para o seu futuro. Fala-se muito na firewall de Hillary Clinton na Carolina do Sul, mas há três semanas que não se fazem lá sondagens e em 2008 também havia esta segurança e depois foi o que se viu. Clinton continua a enfrentar muitos problemas devido ao caso dos emails e esta semana voltaram a ser referidos os chorudos pagamentos que recebeu de discursos que efectuou depois de sair do Departamento de Estado. Num estudo da Quinnipiac, foi colocada atrás sete pontos de Marco Rubio e a desconfiança dos americanos tem crescido. O entusiasmo neste momento está do lado de Sanders e Clinton precisa urgentemente de "perder por poucos" no New Hampshire e vencer na Carolina do Sul, para repor alguma normalidade nestas primárias. Caso contrário, deve mesmo preparar-se para uma longa campanha. 

No Partido Republicano, Marco Rubio cresceu, quer no New Hampshire quer a nível nacional, mas será muito difícil que possa vencer já na terça-feira. Donald Trump permanece como o grande favorito para vencer no New Hampshire, e outro resultado será um desastre para ele. Ted Cruz joga "fora de casa" e tentará obter um bom resultado para a seguir tentar vencer na Carolina do Sul, onde a demografia lhe é mais favorável. Mas as primárias republicanas, que chegaram a ter 15 candidatos, dificilmente não serão uma longa caminhada que se pode arrastar até Junho. Numas primárias republicanas existem sempre dois lados: os conservadores contra o establishment. Este ano surgiu uma linha diferente, com o populismo de Donald Trump. Do lado conservador, Ted Cruz já emergiu como vencedor (eliminando Huckabee, Santorum, Perry, Jindal, Paul e está prestes a acabar com Ben Carson). Marco Rubio precisa agora de fazer o mesmo com John Kasich, Chris Christie e Jeb Bush, e será esse o grande ponto de interesse destas primárias. Se, como esperado, Marco Rubio conseguir um bom segundo lugar, a corrida irá continuar a três: Donald Trump, Ted Cruz e Marco Rubio. E é aí que Rubio poderá emergir como potencial vencedor, apesar de previsivelmente não vencer nenhuma das duas primeiras eleições. Esta semana já recebeu o apoio de dois antigos concorrentes, Bobby Jindal e Rick Santorum, que por pertencerem à ala mais conservadora, poderão ajudá-lo na união das várias facções do partido. Isto, claro, se não houver surpresas na terça-feira

 


04
Fev 16
publicado por Nuno Gouveia, às 00:43link do post | comentar

Num ano normal, os endorsements de senadores, congressistas e governadores costumam ser um bom indicador para sabermos quem irá obter a nomeação. Estes são importantes para obter apoio nos diferentes estados, pois apesar dos políticos terem relativamente má imagem na generalidade da sociedade, os americanos gostam dos seus eleitos (as taxas elevadas de reeleição assim o provam). Esta campanha republicana tem sido atípica e não é por acaso que  tem havido poucos endorsements, comparativamente com outros anos eleitorais. Do lado democrata, Hillary tem uma vantagem avassaldora sobre Bernie Sanders.

 

Nate Silver tem um endorsement tracker e anunciou hoje que Marco Rubio passou para a liderança do lado republicano, depois de ter recebido o apoio do senador da Pensilvânia, Pat Toomey e de mais dois congressistas. O segundo classificado é Jeb Bush, apesar dos seus apoios terem sido quase todos recebidos na fase inicial desta campanha. Desde Dezembro apenas recebeu o apoio do senador Lindsay Graham, depois deste ter desistido da eleição. De resto, destaque para Donald Trump, que não tem um único apoio de eleitos republicanos, enquanto Ted Cruz apenas tem o apoio de congressistas. Marco Rubio recebeu hoje também o apoio de Rick Santorum, que anunciou a sua desistência da corrida presidencial. Do lado democrata, não há duvidas de que lado está o Partido: no ranking de Silver, Hillary Clinton tem 465 pontos contra dois de Bernie Sanders, que correspondem ao apoio de dois congressistas. Depois do New Hampshire, a sucessão de endorsements deverá aumentar, sobretudo do lado republicano. 


02
Fev 16
publicado por Nuno Gouveia, às 21:28link do post | comentar

Nos últimos meses prognostiquei, e também aqui, que estas eleições iriam ser decididas entre Ted Cruz e Marco Rubio (com vantagem para este último) e que Hillary Clinton teria uma nomeação mais ou menos facilitada. Apesar dos últimos tempos terem desmentido parcialmente essa minha previsão, mantenho a minha aposta quanto aos nomeados. Se isso suceder, então as regras não escritas das primárias ainda contarão alguma coisa, e Rubio será o escolhido porque é aquele quem tem mais hipóteses de unir as facções do partido e de vencer as eleições gerais, enquanto Hillary, que está há mais de uma década a concorrer, desta vez não falhará a nomeação. Se analisarmos o estado da corrida, mesmo depois dos resultados do Iowa, encontramos algumas fragilidades nessa minha previsão inicial, é verdade. O radicalismo de ambos os lados, com a candidatura insurgente de Bernie Sanders, o candidato mais à esquerda desde George McGovern em 1972, e com o populismo xenófobo de Donald Trump e o radicalismo ideológico de Ted Cruz, está a ameaçar o status quo partidário americano. Mas vamos por partes. 

 

Hillary Clinton ontem apenas venceu no Iowa devido a tecnicalidades (consta-se que ganhou seis caucus com moeda ao ar) e parte para o New Hampshire em maus lençóis. Isto apesar de manter uma grande vantagem nos estados seguintes, na Carolina do Sul e Nevada, e liderar confortavelmente as sondagens nacionais. Mas tudo pode precipitar-se após o New Hampshire, onde é esperada uma vitória de Bernie Sanders. Este, com um discurso populista (recorde-se que o candidato afirma-se socialista, uma palavra maldita no mainstream americano), propõe-se a liderar uma revolução contra Washington - ele que está lá desde 1991, primeiro no Congresso e depois no Senado. Ontem teve o apoio entusiástico da juventude, com mais de 84% dos votos dos eleitores com menos de 30 anos, a fazer recordar as votações de Obama em 2008. Mas o problema para Sanders é que ele, velho senador de 74 anos, não mostrou ainda que tem condições para replicar a coligação de Obama, ao não captar o voto das minorias étnicas e das mulheres. O voto da juventude será escasso para o levar à nomeação. Precisará de alargar o seu apoio, sobretudo em relação às minorias, sem as quais não conseguirá obter a nomeação. Nas próxima semanas, Hillary Clinton terá de fazer o seu trabalho: tentar perder por pouco no New Hampshire e selar vitórias categóricas no Nevada a 20 de Fevereiro - onde ganhou em 2008 -  e na Carolina do Sul a 27, onde é amplamente favorita, dado a elevada população afro-americana. Se for assim, chegará à Super Terça-feira, a 1 de Março, com reais hipóteses de selar a nomeação nessa semana. Repito, isto é o cenário mais plausível. Não quer dizer que vá acontecer, principalmente se Bernie Sanders começar a crescer nos inquéritos nacionais e no Nevada e Carolina do Sul. É que apesar de ter perdido ontem por poucos, a sua cobertura mediática foi positiva e isso pode catapultá-lo para outros voos. Improvável, mas possível.

 

No Partido Republicano, é bem mais complicado tentar adivinhar os próximos passos. É bem possível que após o New Hampshire haja uma total redefinição do leque de candidatos, com vários abandonos, e que fique uma corrida a três, entre Ted Cruz, Donald Trump e Marco Rubio. Só no final desta semana é que começarão a sair sondagens efetuadas após o Iowa, e é preciso esperar para analisar os estudos estaduais e nacionais. Diria que Marco Rubio e Ted Cruz tenderão a crescer e Donald Trump a descer. O senador do Texas irá competir no New Hampshire, mas a sua cabeça passará a estar na Carolina do Sul, onde os evangélicos representam mais de 60% do eleitorado e que lhe podem dar uma vitória a 20 de Fevereiro. Trump tentará obter uma vitória no New Hampshire e até tem tido uma grande vantagem nas sondagens neste estado, mas resta ver o quanto irá descer depois da derrota de ontem. Marco Rubio não precisa de ganhar, embora se tal acontecesse, assumiria desde logo o estatuto de principal favorito e partiria para a Carolina do Sul com grande força para derrotar Ted Cruz. Mas o principal objectivo de Rubio será ficar bem acima dos 20% e eliminar já no New Hampshire a concorrência pelo estatuto de candidato das elites e do mainstream do partido. Para isso, terá que anular John Kasich, Chris Christie e Jeb Bush. Estes tiveram resultados péssimos no Iowa, mas isso já era esperado, e jogam tudo no New Hampshire. Não parece credível, no entanto, que algum destes candidatos mais centristas consigam sobreviver nas próximas semanas. Isto quererá dizer que Marco Rubio será a última esperança dos republicanos moderados, um cenário que já se vem desenhando há algum tempo. Ted Cruz seria o candidato mais à direita do Partido Republicano desde 1964. Donald Trump, bem, seria o elemento mais estranho de sempre a ser nomeado por um dos dois partidos do sistema político americano. O mais parecido que apareceu foi George Wallace, o antigo democrata que se candidatou como independente numa plataforma racista em 1968. De qualquer forma, parece que esta vai ser uma corrida longa e será difícil que a 1 de Março haja vencedor definitivo. Prevejo uma longa corrida, com Rubio a vencer no final Cruz e/ou Trump. A menos que Rubio consiga vencer no New Hampshire e Carolina o Sul, imitando Mitt Romney e John McCain. Improvável, mas possível.

 

Se isto tudo não tiver passado de um grande entretenimento, então teremos Hillary Clinton de 68 anos contra Marco Rubio de 44 anos. Um grande gap geracional em confronto. O inverso que tivemos em 2008, com John McCain de 71 anos e Obama, de 46 anos.

 


publicado por Nuno Gouveia, às 10:18link do post | comentar | ver comentários (8)

1 - O Partido Republicano suspirou de alívio ontem depois da derrota de Donald Trump. Apesar do vencedor, Ted Cruz, ser também um político odiado, a derrota de Trump e o forte terceiro lugar de Marco Rubio alivou muita gente. A votação recorde no Iowa demonstrou também que houve uma grande mobilização para derrotar Trump, o que pode ser replicado noutros estados. Essa foi a grande notícia para a máquina republicana. 

 

2- Ted Cruz e Marco Rubio emergiram como grandes vencedores nos caucuses do Iowa. Este estado, que nos dois anteriores ciclos eleitorais deu vitórias a evangélicos, manteve a recente tradição e deu uma vitória inesperada a Cruz. Rubio ao conseguir um terceiro lugar, muito perto de Trump, solidifica a sua posição como candidato do establishment e pode, já na próxima semana, “arrumar” com Jeb Bush, Chris Christie e John Kasich, os adversários neste campo. Se é verdade que desde 1964 os republicanos optam sempre pelo candidato melhor posicionado para as eleições gerais, este ano poderá não ser diferente.

 

3 - Donald Trump afinal é um "perdedor", palavra que ele detesta. Se até há uns meses atrás, a esmagadora maioria dos analistas (e eu também) não acreditava nas suas hipóteses de obter a nomeação, nos últimos tempos essa percepção foi alterada. A sua derrota no Iowa coloca novamente em causa essa possibilidade, e atira uma enorme pressão para cima dele no New Hampshire. À entrada para esta semana, ele liderava confortavelmente as sondagens aí, mas até como vimos no Iowa, elas podem falhar e os movimentos de última hora, podem-lhe retirar a vitória. Se não vencer no New Hampshire, a sua candidatura estará praticamente terminada. 

 

4 - Marco Rubio irá agora competir no New Hampshire, não propriamente para ganhar, mas para eliminar a concorrência próxima. Ficaria surpreendido se a vitória no New Hampshire não fosse discutida entre Rubio e Trump. Ontem foi anunciado que o popular senador negro da Carolina do Sul, Tim Scott, irá declarar-lhe o seu apoio e nos próximos dias devemos ver um movimento de figuras do Partido Republicano a colocarem-se ao seu lado. Depois desta vitória, e acreditando que alguém tão conservador como Ted Cruz dificilmente terá uma hipótese no moderado New Hampshire, este irá deslocar-se rapidamente para a Carolina do Sul. Aí, podemos ter uma luta a três (se Trump vencer no New Hampshire) ou a dois, caso Rubio consiga ganhar. Tudo em aberto, mas para o resultado final, apostava em Marco Rubio para nomeado republicano. 

 

5 - No lado democrata, a confusão está instalada. Hillary Clinton já se declarou vencedora com 49,9% contra os 49,5% de Bernie Sanders, mas este ainda não aceitou a derrota. Uma vitória é uma vitória e Hillary Clinton ter-se-á salvado de nova derrota no Iowa, depois de há quatro anos ter sido esmagada por Barack Obama e John Edwards. Um resultado que não pode deixar descansado o campo de Hillary, pois há um ano tinha uma vantagem de mais de 50% sobre Sanders neste estado.

 

6 - Para a próxima semana, Bernie Sanders poderá obter uma vitória confortável no New Hampshire. Os resultados do Iowa não darão "momentum" a Hillary Clinton. Mas parece-me que Bernie precisava de vencer aqui para transformar-se num candidato nacional, o que não sucedeu. Muita gente a comparar com o que aconteceu com Obama, que quando chegou ao Iowa também estava atrás de Hillary em quase todos os estados e nas sondagens nacionais. Mas foi essa vitória que o fez crescer. Parece-me muito complicado para Sanders replicar. A seguir ao New Hampshire, segue-se a Carolina do Sul, onde Hillary Clinton é super favorita. 

 

7 - Caso não exista nenhum movimento extraordinário pró-Sanders nas sondagens nacionais e noutros estados, Hillary Clinton poderá fechar a nomeação na super terça-feira em Março. Mas entrará relativamente frágil nas eleições gerais. Ontem os jovens votaram de uma forma avassaladora em Sanders, e com os problemas todos que Hillary tem tido, não terá vida fácil em Novembro. A sua campanha tem dado sinais que o candidato que mais a preocupa é Marco Rubio. Precisamente aquele que parece emergir do outro lado. 


31
Jan 16
publicado por Nuno Gouveia, às 12:57link do post | comentar | ver comentários (3)

Depois de meses de campanha, de sondagens e de casos, os americanos começam amanhã a escolher os nomeados dos dois partidos para disputarem a sucessão de Barack Obama. E as coisas não podiam começar de forma mais surpreendente, com Hillary Clinton numa eleição competitiva e Donald Trump a liderar as sondagens republicanas. A verdade é que nem Hillary tem a nomeação garantida e Trump, ao contrário do que muitos vaticinaram (como eu), tem mesmo uma real hipótese de obter a nomeação, isto se não for já o favorito.  A última sondagem publicada no Iowa, do credível Des Moines Register, coloca Hillary três pontos à frente de Bernie Sanders e Trump cinco pontos à frente de Ted Cruz. Mas antes de perspectivar cenários em ambos os partidos, uma nota histórica:

Há quatro anos, a mesma sondagem dois dias antes dava os seguintes resultados: Mitt Romney 24%, Ron Paul 22% e Rick Santorum 15%. O vencedor acabou por ser Rick Santorum, com 25%, que nunca tinha liderado nenhuma sondagem e acabou por fazer uma grande recuperação nos últimos dias da campanha. Em 2008, a última sondagem dava a Barack Obama 32%, a Hillary Clinton 25% e a John Edwards 24%. Aqui a sondagem ficou muito próxima, com Obama a ter 37% e Clinton com 32%. Do lado republicano, a sondagem do DMR colocava Micke Huckabee com 32%, Mitt Romney com 26%, John McCain com 13% e Fred Thompson com 9%. No final, Huckabee venceu com 34%, Romney com 25%, Thompson com 13% e Mccain em 4º com 13%. 

Esta última sondagem, até pela proximidade dos candidatos, deixa ainda espaço para surpresas de última hora, mas a acreditar nestes números, Clinton poderá confirmar o favoritismo que tem tido ao longo desta campanha, e Trump poderá mesmo vencer no Iowa e tornar-se um pesadelo do establishment e das elites do partido. Acredito que se Trump vencer no Iowa e na semana seguinte, no New Hampshire (onde também tem liderado as sondagens), a sua candidatura poderá mesmo tornar-se muito forte de parar. 

Hillary Clinton tem tudo para ganhar, pois apesar do entusiasmo que tem gerado Bernie Sanders, tem no terreno uma máquina muito eficaz e, segundo a sondagem do DMR, os seus apoiantes são os que estão mais motivados a participarem nos caucuses. Como tem sido dito na imprensa americana, no final isto tudo vai ser definido pela afluência, e aí, Clinton poderá ter vantagem. Até porque estão previstas fortes tempestades de neve amanhâ à noite no estado do Iowa, o que poderá fazer com que os eleitores menos comprometidos poderão ficar em casa. 

Essa pode também ser uma ameaça para Donald Trump, que segundo a mesma sondagem, tem os apoiantes menos "comprometidos", apesar da liderança na sondagem, e quer Ted Cruz, quer Marco Rubio têm uma hipótese. Juntando as primeiras e segundas opções, Cruz tem 40% e Rubio 35%, o mesmo valor do que Trump. Nas últimas semanas falou-se muito de um crescimento de Rubio no Iowa, e apesar de na média de sondagens haver uma subida do senador da Florida, parece-me curto para sequer chegar ao segundo lugar.

 

Nota sobre os caucuses:

* É um sistema bastante complexo, que elegerá 50 delegados no Partido Democrata e 30 delegados do lado republicano. As votações começam às 19h00 (2h00 de Lisboa). Os caucuses são reuniões dos comités eleitorais locais dos partidos em que um candidato é escolhido sem uma votação propriamente dita. Neste sistema, os eleitores de cada partido encontram-se em várias reuniões, para debaterem a nomeação dos delegados e escolherem os seus representantes. Estas reuniões ocorrem em igrejas, escolas ou casas particulares. Qualquer pessoa pode participar, desde que esteja inscrito nos cadernos eleitorais como republicano ou democrata, conforme for o caso. Nos Estados Unidos, em alguns estados, o recenseamento eleitoral implica ficar registado como Republicano, Democrata ou Independente. Durante estas reuniões, os participantes debatem política e as suas opções, escolhendo os seus representantes, que depois, a nível distrital irão escolher os delegados para a convenção estadual, que finalmente irão nomear os delegados para a convenção nacional do partido. 


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